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Alguns elementos de crítica a serem considerados na elaboração de um Plano Municipal de Educação que leve em conta as reais necessidades da rede municipal de educação de São Paulo

Enviado por on 11 de novembro de 2009 – 20:04nenhum comentário

Leia artigo escrito por João Kléber Santana*, diretor de escola da rede municipal de educação de São Paulo

Política Educacional

Aumenta-se o controle sobre o que denominam gestão de sala de aula. O problema é centrar toda a solução dos problemas da educação nos professores, como se não houvesse política de estado para isso (ou a falta dela). Não há uma política de Estado séria de formação de professores. Não há diálogo entre as licenciaturas no ensino superior e as redes públicas. A quem caberia estimular este diálogo? Ao movimento estudantil? Ao sindicato? Até podem, mas me parece ser dever do Ministério da Educação, da Secretaria Estadual de Educação (SEE) e da Secretaria Municipal de Educação (SME), além, talvez, dos conselhos de educação. A SME centrou quase toda sua política de formação nos Coordenadores Pedagógicos e, agora, cobra destes os resultados, como se os mesmos fossem o único elo necessário.

Na regulamentação das funções, a mesma questão. O coordenador pedagógico virou um “faz tudo” com a diminuição de quadros intermediários (extinção do auxiliar de direção, por exemplo) entre a sala de aula e a escola. O Coordenador Pedagógico tem responsabilidade com a formação do professor, para isso também precisa ser capacitado. Tem que implantar os programas educacionais da administração (que mudam a todo momento), precisa fazer a ponte e estabelecer o diálogo entre os docentes, entre docentes e alunos, alunos entre si, docentes com os pais etc.

Currículo

Currículo, outro fator importante, o debate sobre o que ensinar e aprender. Não há na rede nenhuma discussão democrática, com continuidade e profundidade que o tema merece. Não bastam apenas algumas reuniões com alguns profissionais para referendar propostas da administração de plantão. Chegou a haver uma publicação para todos no primeiro ano da gestão Marta Suplicy (2001-2004) sobre o tema, propondo o debate, mas foram logo esquecidos – a publicação e o debate. Depois, mudam o método, convidam alguns professores e publica-se um parâmetro, referencial, sugestão, manual, o nome que for. Os demais professores interpretam os sinais de fumaça que são oferecidos.

Metodologia de Ensino/Aprendizagem

O Programa de Formação de Professores Alfabetizadores (PROFA) teve continuidade no programa Ler e Escrever e Programa Intensivo no Ciclo. Mas dissociado, uma gestão ofereceu cursos de formação para os professores, a outra ignorou e centrou a formação nos Coordenadores Pedagógicos. Em algumas escolas as iniciativas se combinaram e parece ter dado melhores resultados, mas foi o acaso que juntou docentes e Coordenadores Pedagógicos com a mesma formação. Na alfabetização inicial é onde se consegue perceber maior continuidade, nas diversas gestões estaduais ou municipais, no âmbito do que se chama construtivismo. Uma conjunção de fatores permitiu a algumas pessoas permanecer em alguns lugares e com isso ocorrer continuidade na formação. O problema, neste caso, é a falta de estímulo a inovação e reconhecimento do acúmulo que os professores adquiriram. As atuais cartilhas dos programas repetem os mesmos exemplos, não dando espaço e reconhecimento para a inovação que os professores trazem.

Avaliação e ensino fundamental II

No ensino fundamental II a política estatal é nula em relação à metodologia. Ocorrem, no máximo, palestras isoladas, sem nexo ou continuidade. Nos orçamentos publicados pela maioria das diretorias regionais de ensino, a rubrica formação representava gasto zero. Onde havia algum tipo de investimento, era irrisório. Os recursos para formação estavam centrados nos manuais produzidos pela Secretaria Municipal de Educação. É compreensível que a administração quisesse estabelecer “referenciais básicos” e que fosse necessário investir inicialmente na sua elaboração, mas não seria necessário também investir na compreensão desse material para todos os professores, realizando-se cursos de formação?

Há diversos cursos de extensão, focados no ensino e na aprendizagem, onde se pode refletir sobre cada disciplina, elaborar projetos de aula, focar o conteúdo, relacionando-o à metodologia. Esta formação não pode ser buscada apenas com recursos próprios dos docentes, tem de haver investimento público, tanto propiciando tempo necessário para formação, quanto financiando a formação a partir de diretrizes de estado. Não encontramos programas públicos com a finalidade de aproximar conteúdo/currículo de metodologia de ensino/aprendizagem, além do semestre de licenciatura da formação inicial. Ou, no caso dos servidores efetivos, para atendimento das exigências da LDB, em formação inicial dos professores com magistério. Os orçamentos dos governos com formação são ridículos, algumas administrações fizeram até empréstimos externos e conseguiram piorar cursos que já haviam no ensino superior, muitos com gastos per capita superiores ao que investe-se do próprio bolso em formação, em geral são ações aligeiradas, descontextualizadas e sem continuidade, com custos altos, sem objetivos claros.

Como administrar uma rede sem prever investimento em valorização profissional, respeito à trajetória profissional, investimento (no sentido de criar condições para) em formação continuada, em debates e trocas de práticas de ensino? E, depois, responsabilizar o profissional em educação pelo mau desempenho em avaliações institucionais? Temos sistema de ensino ou um vale tudo com cada um por si? Agora, a solução salvadora será estimular a competição entre os docentes em uma avaliação externa, vinculando desempenho na prova à política salarial e evolução financeira na carreira. Se o servidor quiser comer melhor, receber mais para sua própria formação, submeta-se a uma prova. Qual a relação entre isso e a formação e o trabalho efetivo em sala de aula?

Não podemos esquecer a estrutura e o funcionamento do ensino, ciclos, seriação, duração dos turnos, duração da hora-aula, número de alunos por turma, número de turmas por professor, relação entre tempo de regência e horas adicionais na própria escola. Esses fatores parecem passes de mágica, soluções milagrosas. Aumentar a hora aula para 55 minutos vai resolver os problemas de rendimento escolar, se o ciclo for de 2 em 2, 4 em 4 vai haver melhora na aprendizagem, se as turmas forem de 45, depois 40, os alunos aprenderão melhor. Se uma parte da grade curricular for privatizada… Se São Paulo imitar Nova York tudo irá melhorar (Aliás, Nova York é modelo educacional por quê? Se for necessário imitar algum país, que seja a Finlândia). Aproxima-se do ridículo a forma amadora como são tratadas essas questões. Muitas vezes parecem ter por objetivo apenas desestruturar e criar bases para a privatização da rede pública.

Sistema Educacional X Financiamento

Parece não haver uma visão sistêmica no sentido mais amplo, ora investe-se em um, ora em outro fator. Não temos uma política que leve em conta o conjunto dos elementos qualitativos que estão relacionados à educação. Ao mesmo tempo, afirma-se que a educação possui verbas suficientes, não sendo necessário maior investimento, apontando-se como problema a gestão da escola e da sala de aula, nunca a própria administração. Reduzir a questão do financiamento e da gestão à unidade escolar significa apenas gestão de carências. Talvez entendam que um bom gestor é quem melhor administrar a escassez de recursos humanos, materiais, custeio, formação etc. Quem conseguir, em algum momento, dar sorte de conseguir professores motivados e com formação, uma estrutura mínima, alguns recursos extras de algum programa governamental ou externo de momento, terá reconhecimento. Não há padrão mínimo na rede.

Mesmo com alguma autonomia financeira mínima, é ridículo o montante a ser administrado. Se a escola resolver investir, por exemplo, em circulação dos alunos em atividades de enriquecimento curricular como trabalhos externos, excursões a museus, teatros, locais históricos, oferecendo oportunidades a todas as turmas, todo o recurso não seria suficiente. Não haveria recursos para manutenção e outros investimentos estruturantes na escola. E ainda, tratam os conselhos de escolas e gestores como amadores na gestão de recursos.

*Este artigo faz parte de uma iniciativa da Campanha Fala Educador, Fala Educadora! que busca dar voz ao professorado, por meio da publicação de artigos, opiniões e reflexões sobre o cotidiano escolar e o ofício docente. Se você é professor(a) e deseja participar enviando um texto, escreva para observatorio@acaoeducativa.org

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