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Tipificar o crime não resolve a violência contra o professor na sala de aula, afirma pesquisador

Enviado por on 11 de dezembro de 2009 – 17:43nenhum comentário

Leia entrevista com Renato Alves, pesquisador do Núcleo de Estudos da Violência da USP, sobre a proposta de legislação referente à violência contra o professorado na escola (leia mais aqui). Ele questiona a medida por não, necessariamente, influir no cotidiano escolar e transformar as relações.

Observatório da Educação – De que forma o sr. avalia a proposta do senador Paulo Paim de tipificar a violência cometida contra o professorado em sala de aula?

Renato Alves - Em linhas gerais, é criminalizar o que está aí e, nem sempre, quando se criminaliza, ou tipifica, resolve-se o problema. Por exemplo, quando houve a tipificação do sequestro como crime hediondo, não necessariamente houve uma redução do sequestro. O problema dessa lógica é, primeiro, que a pessoa que vai cometer um ato de violência não necessariamente faz um cálculo do que vai ganhar e perder. Na maior parte das vezes isso não acontece. Criminalizar não necessariamente diminui o comportamento agressivo ou violento. Ainda mais na escola, que são problemas muito mais basais, o que demanda reformulação pedagógica, do trabalho escolar, não necessariamente só criminalizar sem trabalhar o que está no cotidiano escolar.

Nos últimos anos, a escola passou por muitas transformações, inclusive de sentido. A escola que existia nos anos 70/80, voltada ao trabalho e vestibular, calcada em cima dessas matizes, hoje não existe mais. Para trabalho não faz sentido porque muitos estão estudando e não, necessariamente, têm trabalho. No caso do vestibular, hoje há uma universidade em cada esquina. É possível entrar até sem fazer prova. Tudo isso muda o sentido de escola, assim como os valores mudaram. E mudam também as relações.

Não vejo como uma lei teria força sem esse trabalho de trazer o tema da violência de forma transversal, como parte da formação escolar. É preciso começar a trabalhar isso desde os ciclos mais básicos. A lei seria uma força para coibir algo que é resultado do que não foi ensinado. A criminalização aponta o fracasso da educação, do que não se constituiu isso como um princípio via educação. Só ter a lei é continuar no fracasso.

OE – Então esse seria o caminho para resolver o problema da violência?

Alves - Sim. Aqui temos um trabalho mostrando a importância de coibir, desde o início, brincadeiras violentas, piadas de mau gosto, o bulliyng. Logo que se começa a ver isso é importante intervir para que não se desdobre em atos mais violentos, nem se naturalize. É preciso, precocemente, agir para evitar que esse tipo de situação se agrave, se desdobre em situações mais graves. A escola atuar de maneira educativa, somando-se ao que a família e comunidade devem fazer, é fundamental para coibir esse tipo de situação, mais que ter uma lei. Além de dar formação para os professores, condições adequadas, classes menores, isso tudo implica em repensar o papel da escola e a função da educação. A lei vai ter impacto muito pequeno.

Aumento de pena não diminui o impacto do crime, não é cálculo racional que se faz. Uma pessoa não deixa de matar a outra porque vai pegar uma pena maior, perpétua ao invés de 30 anos… É outra lógica.

OE – E a questão do assédio moral, como se reflete no cotidiano escolar?

Alves - Sabemos hoje que as relações dentro da escola estão extremamente autoritárias. Aí querem que esse mesmo professor, que no seu dia-a-dia não é ouvido nem bem tratado, seja democrático em sala de aula. A relação professor-aluno é contaminada por essa violência institucional, porque esse trabalhador sofre dentro da própria instituição.

OE – Então há relação com a violência na escola?

Alves – Sim. As relações institucionais, hierárquicas, muitas vezes estão próximas de uma relação violenta. Além das relações com a direção da escola, por exemplo, os professores muitas vezes não têm espaço nenhum na construção de políticas educacionais. Elas vêm de cima pra baixo e os professores têm de aceitar. Esses tipos de ação, que passam pelas hierarquias, vão estourar no ponto mais fraco, que é a relação entre professor e aluno. Arbitrarismos da coordenadoria de ensino em relação à direção da escola também influenciam, não só problemas na relação entre professor e direção. Os arbitrarismos vão atravessando essas esferas.

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