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Seminário debateu desafios para a efetivação do direito à educação nas prisões

Enviado por on 2 de maio de 2011 – 20:45nenhum comentário

São Paulo ainda não apresentou sua proposta, com base nas diretrizes nacionais, de educação no sistema prisional

As dificuldades para garantia do direito à educação para as pessoas privadas de liberdade foram o tema do seminário Desafios para a Implementação das Diretrizes Nacionais sobre a Educação em Prisões (conheça as diretrizes aqui).

Apesar da presença de Felipe Melo, do Grupo de Trabalho (GT) sobre Educação nas Prisões do governo de São Paulo – formado por representantes das secretarias de Educação, Desenvolvimento, Ciência e Tecnologia e Administração Penitenciária e da Casa Civil –, não foi apresentada a proposta do governo para a implementação das diretrizes no estado. Um conjunto de dez organizações que trabalham com o tema chegou a solicitar participação no grupo, mas o pedido não foi atendido (leia mais aqui).

Melo explicou que o GT concluiu o trabalho no início da semana passada. O norte do documento entregue ao governador, segundo Melo, é a “legalidade e o reconhecimento do que foi feito por São Paulo nos últimos 31 anos”. Melo afirma que os próximos desafios que se colocam é fazer um amplo debate sobre o plano que será apresentado pelo governador e “a elaboração de um projeto político-pedagógico para o sistema prisional”.

Indagado sobre o conteúdo da proposta que o governo de São Paulo possui para a educação em prisões do Estado, Melo afirmou que é preciso esperar o anúncio do governador: “vim aqui para descrever o processo. O governador vai responder isso oficialmente em outra ocasião”. Ainda não existe uma data para o anúncio.

Denise Carreira, relatora nacional para o direito à educação e coordenadora da Ação Educativa, lamentou a ausência das entidades da sociedade civil dentro do GT. Segundo ela, a participação da sociedade é “fundamental para a implementação das diretrizes no estado de São Paulo”. Melo afirmou que as entidades serão convidadas após o anúncio da proposta governamental, mas não explicou de que forma a participação se dará.

São Paulo possui a maior população carcerária do Brasil. Dados do Ministério da Justiça (dez/2010) apontam que há mais de 170 mil presos e presas no estado, sendo que cerca de 87 mil cumprem pena em regime fechado e 54 mil ainda aguardam julgamento. Além disso, o sistema penitenciário paulista não dispõe de professores e pedagogos e o grau de escolaridade da população carcerária é baixo: mais de 95 mil não possuem o ensino fundamental completo. Isso significa que mais da metade dessas pessoas não tiveram acesso à educação quando crianças ou jovens.

Situação nacional

Além de Melo, participaram do debate o coordenador-geral de educação nas prisões no Ministério da Educação, Carlos Teixeira; Mário Miranda Neto, da Comissão de Educação do Conselho Penitenciário do Rio de Janeiro; Andrea de Lima Kravetz, da Escola Penitenciária do Paraná; e Roberto Catelli, coordenador do programa Educação de Jovens e Adultos da Ação Educativa.

O coordenador geral de educação nas prisões do Ministério da Educação admitiu que as ações do MEC “estão longe do ideal”, mas afirmou que, para a implantação, é fundamental a “colaboração dos estados”. Para Carlos Teixeira, “é preciso que a sociedade civil pressione para que os conselhos estaduais se manifestem e façam com que o compromisso [das diretrizes] seja de fato cumprido”.

Roberto Catelli teceu um panorama geral da educação em prisões no país e avaliou que, embora venha se consolidando nos últimos anos como um direito, este a educação em ambiente prisional ainda é encarada como privilégio: apenas 8,1% dos detentos do país estão em atividade educativa. “Ninguém está fazendo um favor quando propõe educação nas prisões. É um direito humano previsto na legislação internacional e brasileira”.

Para a garantia de uma educação de qualidade nas prisões, Catelli destacou a necessidade de valorização e de uma formação adequada para o profissional de educação que trabalha nas penitenciárias. “Não se educa sem a competência adequada”. Ele também mencionou a necessidade de se discutirem as peculiaridades da modalidade. “Será que precisa de material específico para a educação nas prisões? Uma metodologia e diretrizes pedagógicas com certeza”.

Concordando com Catelli, Teixeira disse que o ideal é que os “professores sejam habilitados”, pois o educador não pode “entrar ingênuo [na unidade], sem conhecer as complexidades. Isso fragiliza a sua prática, fazendo com que o processo educativo perca muito em qualidade”. Mas ressaltou que “o processo seletivo é prerrogativa dos estados”.

Já Mário Miranda afirmou que existe uma grande distância entre a previsão normativa e a realidade do sistema prisional, e ressaltou que é necessário produzir material empírico acerca das vivências e cotidianos das prisões, de modo que sejam formuladas políticas públicas aplicáveis e transformadoras das relações que se dão nos espaços prisionais. Um dos desafios, nesse sentido, é enfrentar aquilo que chamou de “práticas cartoriais”, pelo conhecimento das “dinâmicas” das prisões.

Ensino a Distância

Outro ponto criticado por boa parte dos debatedores é o Ensino a Distância (EaD). Catelli afirmou que a contratação de uma empresa terceirizada, sem participação do Estado e sem preocupação com a qualidade do ensino, é um caminho ruim. “Coloca-se um pacote pronto, que resolve o problema do gestor de um ponto de vista prático, do cumprimento da lei”, mas que, para Catelli, não resolve o problema.

O pesquisador não rechaça, no entanto, a importância das novas tecnologias no aprendizado. “As novas mídias podem ter um papel importante em um aprendizado. Usar todas as possibilidades de comunicação e tecnologia para a educação é extremamente desejável”.

Denise Carreira alertou para a possibilidade de que a EaD afaste os profissionais de educação do aprendizado dos presos. “Estamos muito preocupados com esse caminho. É fundamental que [a educação em prisões] seja feita com profissionais habilitados pela secretaria de educação. E a EAD deve ser feita de forma complementar”.

Carlos Teixeira, do MEC, fez coro às preocupações dos debatedores: “Achar que a EaD resolve tudo é um equívoco. Ela deve se integrar outras atividades presenciais, para que não vire uma solução mágica”.

A experiência paranaense

Andrea de Lima Kravetz, assessora da Escola Penitenciária do Paraná (ESPEN), falou um pouco sobre as mudanças feitas atualmente na área de educação em prisões do estado.

Entre os dados ressaltados, destaca-se o fato de que 28,47% dos presos estão em atividade escolar no Paraná (em São Paulo, a média é de 8,8%). Mas ela considera o número baixo, de modo que a expectativa da ESPEN é chegar a 40% até junho deste ano. Apesar disso, ainda restam três unidades prisionais que não oferecem ensino aos detentos devido a problemas de espaço, diz Andrea.

Outra mudança que, segundo a assessora, ocorrerá em breve é relativa às grades que separam estudantes e professores durante as aulas nas unidades prisionais do estado. Em sua intervenção, Denise afirmou que se trata de um grave problema no Paraná. Andrea, no entanto, explica que “há uma grande resistência por parte dos diretores das unidades, mas os próximos, que virão sob concursos, vão tirar gradativamente”.

Tomado como um exemplo pelos outros debatedores, o processo seletivo do Paraná obriga os candidatos a diretores a apresentarem um projeto para a unidade prisional, em que a educação é um eixo central.

 

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