A educação não pode e não deve estar subordinada a interesses privados, diz pesquisadora
Theresa Adrião, professora da Faculdade de Educação da Unicamp, pesquisa temas como o financiamento e a gestão da educação básica e as relações entre o público e o privado no campo educacional. Em entrevista concedia por e-mail ao Observatório, ela comenta, sob essa ótica, as parcerias da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo (SEE) no programa Educação Compromisso de São Paulo.
Observatório da Educação – O que acha do Programa Educação Compromisso de São Paulo, como um todo?
Theresa Adrião -Em primeiro lugar penso que o fato do governo do Estado apresentar um programa com essa amplitude é um indicativo de que as políticas educacionais até então implantadas foram no mínimo inócuas. Penso que rever os salários e recompor as escolas com um condizente quadro de funcionários são medidas mais que urgentes. No entanto, essa urgência diluída em quatro anos me parece complicada.
Outro aspecto complicado é o foco em escolas prioritárias ou políticas focalizadas. São Paulo viveu experiência semelhante com as Escolas Padrão, na década de 80. Um projeto que focalizava um número limitado de escolas e que não pode, inclusive pela falta de investimento do próprio governo, ser expandido. A história não parece favorecer a perspectiva de expansão do projeto de reorientação para todo o Ensino Médio ou de investimento no Ensino Fundamental. O que ocorrerá com as milhares de outras escolas está em aberto.
Observatório – O que acha da diferenciação salarial e trabalhista entre os professores dessas escolas e das outras? Enxerga algum problema nisso?
Theresa -A diferenciação salarial apenas consolida a percepção de que uma escola de qualidade precisa ter professor em condições de dedicar-se exclusivamente. Assim posto, as condições de jornada deveriam ser estendidas a todos os docentes da rede. Este ponto também repete o modelo de focalização que rompe com a lógica de rede e cria ou aprofunda desigualdades.
Observatório – O que acha da filosofia de “co-responsabilização” das empresas? Isto é, as empresas se responsabilizarem pelas questões sociais (no caso, educação)?
Theresa- Não se trata de filosofia, trata-se de políticas de marketing estimuladas por agências que buscam consagrar ou valorizar as marcas envolvidas. Preocupa-me profundamente que uma política pública voltada para a garantia de um direito constitucional, como é a educação, esteja subordinada e seja pautada por este tipo de empreendimento.
Observatório – O empresariado deve se responsabilizar por essas questões?
Theresa -A questão não é essa, a questão é: pode uma política de Estado se pautar por interesses privados? Penso que não. A educação não pode e não deve estar subordinada a interesses privados.
Observatório – Qual seria o tipo de envolvimento ideal, no seu ponto de vista?
Theresa – A maior contribuição do empresariado seria que todos pagassem seus impostos devidamente e dessa forma contribuíssem para a ampliação dos recursos públicos para a educação, também que combatessem as guerras fiscais, como forma de explicitar seu compromisso com os cidadãos do local em que estão instalados.
Observatório – Acredita que tenha algum problema com o linguajar e a cultura empresarial serem aplicada às escolas?
Theresa -Obviamente que sim, a escola não é uma empresa e não pode ser administrada como tal. A lógica de maximização dos investimentos e diminuição de custos na escola apenas induz a mecanismos de exclusão e ao aumento da seletividade interna do sistema educacional.