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Programa pretende posicionar rede paulista entre as melhores do mundo em vinte anos

Enviado por on 19 de setembro de 2012 – 12:25nenhum comentário

O Programa Educação: Compromisso de São Paulo foi criado por meio do Decreto nº 57.571, publicado no Diário Oficial no dia 3 de dezembro de 2012. Apoia-se em cinco diretrizes (veja quadro abaixo) para “promover amplamente a educação de qualidade na rede pública estadual de ensino e a valorização de seus profissionais”.

Na imprensa, o objetivo anunciado era o de “colocar a educação de São Paulo entre as melhores do mundo”. Segundo a SEE, o resultado seria estimado com base no ranking do PISA, a partir dos resultados do Saeb (Sistema de Avaliação da Educação Básica, do MEC). Atualmente, o Brasil está na 53ª posição entre 65 países (e São Paulo fica atrás de outras unidades da federação como Distrito Federal, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Paraná e Espírito Santo).

Pesquisadores consultados pelo Observatório criticaram a adoção do PISA como único parâmetro de qualidade. “O programa por um lado preconiza o aumento da qualidade da educação, e estabelece como meta aumentar a média de português e matemática no PISA. Mas qual é a relação entre propor melhoria na qualidade e atingir uma média aritmética nesse exame internacional? Qual é a noção de qualidade em jogo aqui?”, questiona Ana Paula Corti, docente do Instituto Técnico Federal e pesquisadora da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (FEUSP).

“Eu não trabalharia com esse tipo de meta – ser melhor, ser igual… tem questões colocadas para as escolas paulistas e brasileiras. É mais uma cortina de retórica do que propriamente fixação de metas”, afirma Ocimar Alavarse, professor da FEUSP e pesquisador na área de avaliação.

Guiomar Namo de Mello, atual presidente do Conselho Estadual de Educação (CEE-SP) e especialista em políticas educacionais, defende a adoção do PISA para nortear o Compromisso. “É uma excelente medida, a métrica dele, a metodologia. E ele é aceito pela maioria dos países, usado como indicador praticamente em todos os países nos quais ele é aplicado. Então me parece que é acertado”, disse em entrevista ao Observatório. Para ela, a discordância ao PISA é ideológica. “É sem dúvida alguma o melhor procedimento de medida utilizado hoje”.

Também é alvo de críticas a descontinuidade das políticas do governo do Estado, que optou pelo lançamento de um novo Programa e não colocou em debate a proposta de um Plano Estadual de Educação. “Programas são marca de governo, então quando a política pública é efetuada por programa, tende a absorver a marca do governo e daquela determinada gestão. No caso de São Paulo, a continuidade do mesmo partido não significou continuidade nas políticas. Foram vários secretários diferentes e cada um procurou dar sua cara aos programas”, analisa Ana Paula.

O fato de o Programa ter sido estabelecido por meio de um decreto também é apontado pela pesquisadora como uma fragilidade. “Dificulta o controle público porque não passa por um debate no Legislativo. Tenho impressão de que faz parte de certa característica geral da Pasta, já há alguns anos, de mostrar indisposição em submeter suas ideias programáticas a uma discussão ampla com a sociedade”.

 

As cinco diretrizes do Educação: Compromisso de São Paulo

Instituído pelo Decreto nº 57.571, de 2 de dezembro de 2011, o ECSP tem por finalidade “promover amplamente a educação de qualidade na rede pública estadual de ensino e a valorização de seus profissionais”.  De acordo com a SEE, será implementado com base nas seguintes diretrizes:

I – valorização da carreira do magistério e das carreiras dos demais profissionais da educação, com foco na aprendizagem do aluno, inclusive mediante o emprego de regimes especiais de trabalho, na forma da lei;

II – melhoria da atratividade e da qualidade do ensino médio, por meio da organização de cursos ou valendo-se de instituições de ensino de referência, observada a legislação vigente;

III – atendimento prioritário às unidades escolares cujos alunos apresentem resultados acadêmicos insatisfatórios, demonstrados por meio do Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo – SARESP, visando garantir-lhes igualdade de condições de acesso e permanência na escola;

IV – emprego de tecnologias educacionais nos processos de ensino-aprendizagem;

V – mobilização permanente dos profissionais da educação, alunos, famílias e sociedade em torno da meta comum de melhoria do processo de ensino-aprendizagem e valorização dos profissionais da educação escolar pública estadual.

Fonte: SEE-SP

Para Guiomar, esse não é um problema, já que o Programa nada mais é que a política já desenvolvida pela Secretaria. “Não importa se foi criado por decreto. Poderia ser decreto, ou portaria, mas ele é uma política que envolve os espaços tradicionais da Secretaria. O Programa no fundo está rearticulando aquilo que a Secretaria já tem. Agora, pode ser desarticulado se mudar [a gestão]? Isso sim, mas isso até a Lei”.

São Paulo é um dos 15 estados que ainda não possuem um plano estadual de educação, de acordo com outro levantamento realizado pelo Observatório em 2010. A necessidade de os estados e municípios elaborarem planos com metas decenais na forma de leis foi determinada pelo Plano Nacional de Educação, aprovado em 2001.

Desde 2003, tramita na Assembleia Legislativa paulista uma proposta construída pelo Fórum Estadual em Defesa da Educação Pública. No mesmo ano, o governo havia apresentado outro projeto (PL 1.066/2003) aos parlamentares, mas o texto foi arquivado a pedido do Executivo em outubro de 2009 e nenhuma das duas proposições chegou a ser apreciada. Em 2010, o governo estadual teria enviado um novo plano ao CEE-SP. O documento, que nunca foi apresentado publicamente, pode ser acessado aqui.

Em entrevista ao Observatório, Guiomar afirmou que participou da elaboração desse documento, por solicitação da então secretária Maria Helena Guimarães. Questionada sobre se há previsão de o Plano ser discutido pelo Conselho, Guiomar diz que sim, mas que vão aguardar o novo Plano Nacional ser aprovado no Congresso. “Estou acabando de assumir a presidência, ainda não tomei pé de tudo, mas em algum momento o Conselho vai ter que discutir um Plano Estadual de Educação”, afirma.

Para Denise Carreira, coordenadora da Ação Educativa, a descontinuidade das políticas é um desafio da gestão não apenas no estado, mas do município e do governo federal – e não só da educação, mas do conjunto das políticas públicas. “Um dos grandes instrumentos para enfrentarmos esse desafio é a construção de planos de educação, previstos na nossa legislação. No estado de SP, o plano estadual de educação ainda não foi debatido, temos dois projetos que até hoje estão engavetados”.

Denise lembra que o PNE em tramitação na Câmara dos Deputados estabelece uma meta para que, em até dois anos, todos os estados e municípios construam ou revisem seus planos por meio de processos participativos, envolvendo diferentes setores da sociedade.


Falta balanço

Outro problema apontado no Programa é que ele é mais restrito que um plano de educação – que pressupõe diagnóstico, metas decenais e participação da sociedade na construção e monitoramento de sua implementação – e pode ter seu alcance limitado ao não olhar para o conjunto da rede.

“Experimentar é importante, só que primeiro tem que fazer um diagnóstico das outras experiências que já ocorreram. São Paulo já experimentou [o ensino médio integral], quais os erros, os acertos? Foi feita uma avaliação das escolas que experimentaram? E isso tudo foi feito no mesmo governo Alckmin, não foi nem em um governo de oposição”, diz José Marcelino, professor da USP de Ribeirão Preto e especialista em financiamento da educação.

“Não tem balanço oficial. No estado você tem um governo que é do mesmo partido há muito tempo e não é capaz de apresentar um balanço. O problema é que o programa é limitado do meu ponto de vista”, diz Alavarse.

Um diagnóstico foi realizado pela consultoria internacional McKinsey & Company, mas, como o serviço foi “doado” pela Oscip (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público) Parceiros da Educação (organização que reúne empresários), a Secretaria afirma que o documento não pertence ao Estado e que não pode, portanto, revelá-lo (leia mais sobre isso na reportagem “Parcerias com empresários são informais”). “Contratam uma empresa para avaliar o programa e os resultados ficam trancados a sete chaves”, lamenta Alavarse.

 

Baixe o levantamento completo em PDF ou clique aqui para voltar ao índice de reportagens do Especial Educação: Compromisso de São Paulo.

 

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