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Quase ¼ das escolas da rede são consideradas prioritárias por critérios de desempenho no Saresp

Enviado por on 19 de setembro de 2012 – 15:21nenhum comentário

 

Em outubro de 2011, a Secretaria afirmou que um dos pilares do Programa Educação: Compromisso de São Paulo seria o de investir em escolas consideradas de “maior vulnerabilidade” – tanto pelo aspecto socioeconômico quanto por seu desempenho no Saresp (Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo).

Com base na divulgação desta e de outras notícias na imprensa, o Observatório da Educação solicitou à Secretaria os critérios objetivos que foram utilizados para definir esse tipo de escola (de infraestrutura, socioeconômico e de aprendizagem).

Além disso, também foi solicitado que a Pasta informasse as ações e recursos específicos destinados às escolas prioritárias; o cronograma de implantação dessas políticas; e dados de infraestrutura dessas escolas.

Os pedidos foram feitos em junho de 2012. Em julho, a SEE enviou uma nota de sua Assessoria de Comunicação, explicando que a menção a “supostos critérios de vulnerabilidade na definição das unidades de ensino para o programa Escolas Prioritárias foi resultado de equívoco de informação interna ocorrido durante a etapa inicial de elaboração dessa iniciativa”.

Escolas Prioritárias

Para reduzir a desigualdade de aprendizado no Estado, o programa Educação — Compromisso de São Paulo prevê intervenção e monitoramento permanentes em 1.206 unidades de ensino consideradas de maior vulnerabilidade, tanto no aspecto socioeconômico, como nos de infraestrutura e de aprendizagem, entre eles o desempenho no Saresp 2010. Para essas unidades, haverá prioridade na formação continuada de professores, investimentos em infraestrutura, implantação do programa de professores-mediadores, salas de leituras e projetos especiais de recuperação do aprendizado dos alunos.

Fonte: Página da SEE em 15 de outubro de 2011 (grifos nossos).

Em resposta ao Observatório, a Secretaria corrigiu a informação e afirmou que apenas o desempenho no Saresp seria o critério levado em consideração para definir escolas prioritárias.

“Esse erro foi decorrente do fato de técnicos da Secretaria terem mencionado, em reuniões informais, uma certa correspondência entre determinados níveis de desempenho de escolas no Saresp e as condições de vulnerabilidade dessas unidades nos aspectos de infraestrutura e de condições de aprendizado”.

A nota informou que a Secretaria avalia a possibilidade de passar a considerar fatores de vulnerabilidade dessa ordem [socioeconômicos e infraestrutura] na elaboração de critérios de desempenho das escolas.

Critérios de corte

De acordo com a Secretaria, portanto, o único critério considerado para a escola ser definida como prioritária é o desempenho de seus alunos no Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de São Paulo (Saresp).

As notas do Saresp são classificadas em quatro níveis – abaixo do básico, básico, adequado e avançado – a partir dos resultados da avaliação em Português e Matemática no final de cada um dos três ciclos de aprendizagem.

Para definir suas escolas prioritárias, a Secretaria considera, em cada escola, o percentual de alunos que teve desempenho “abaixo do básico” em uma das duas áreas (veja gráfico e tabela com os valores abaixo).

Basta que uma das seis condições do quadro abaixo sejam atendidas para que a escola entre para o grupo de prioritárias. O gráfico mostra a recorrência desses critérios nas escolas de acordo com o segmento de ensino que oferecem.

A Secretaria não informou os critérios que a levaram a realizar este recorte – por exemplo, uma escola em que 74% dos estudantes de ensino médio apresentem desempenho abaixo do básico é considerada prioritária; uma escola em que 73,9% dos estudantes apresentem esse nível, não é.

Perfil das prioritárias

Segundo a Secretaria, há, neste ano, 1.206 escolas na lista de prioritárias – o que representa quase um quarto da rede. No entanto, em material enviado ao Observatório como resposta aos pedidos de informação, nenhuma das tabelas apresenta esse número – há listas com 1.209, 1.062 ou 1.136 (leia mais sobre a inconsistência dos dados no quadro ao final desta reportagem).

A maior parte dos estabelecimentos (87%) possui ensino fundamental e médio (veja gráfico abaixo). Apesar de os critérios de infraestrutura não serem levados em consideração para a definição dessas escolas, a maior parte delas não possui bibliotecas ou laboratórios de Ciências (conforme mostra a tabela a seguir).

A realidade das escolas prioritárias contrasta com o investimento de infraestrutura feito nas escolas de ensino médio integral – que, de acordo com o secretário Herman Voorwald, “passaram por reformas e terão uma infraestrutura de tecnologia e física invejável” (leia mais na reportagem sobre as escolas de tempo integral).

 

Ações específicas

A partir do momento em que uma escola é definida como prioritária, quais são as políticas específicas direcionadas a elas? Quando lançou o Compromisso, a Secretaria afirmou, de maneira genérica, que implantaria projetos especiais e destinaria recursos extras para essas escolas.

No entanto, nove meses após o início do programa, o diagnóstico das necessidades das escolas ainda não foi finalizado. Esta, de acordo com a SEE, seria a primeira etapa da iniciativa, “o levantamento das situações específicas de cada escola, através da análise combinada de dados estatísticos produzidos no interior da rede de ensino com um diagnóstico local”.

Ocimar Alavarse, da FEUSP, concorda que o diagnóstico e o planejamento sejam feitos a partir das próprias escolas. “Mas há condições iniciais que precisam ser satisfeitas para todas as escolas sem distinção, por exemplo questões de infraestrutura e condições de trabalho e fixação de professores. Isso é inegociável”, afirma.

Segundo a SEE, ao diagnóstico de cada escola está vinculado um plano de ação específico para cada realidade e suas necessidades. Trata-se do Plano de Ação Participativo (PAP), que vem sendo desenvolvido nas escolas da rede.

Em seu site, a Secretaria explica que o PAP pressupõe a participação da comunidade escolar no processo de autodiagnóstico escolar e no planejamento de ações. Essas etapas são organizadas em 40 focos de análise divididos em cinco dimensões: (1) Gestão Pedagógica; (2) Gestão Participativa; (3) Gestão de Recursos Humanos; (4) Gestão de Recursos Físicos e Financeiros e (5) Gestão de Resultados Educacionais.

Os documentos contendo tutoriais para o PAP podem ser encontrados no endereço: http://www.educacao.sp.gov.br/portal/projetos/compromisso-sp/escolas-prioritarias.

A Secretaria também listou uma série de outras medidas que serão articuladas às políticas para as escolas prioritárias e que já estariam sendo desenvolvidas: atribuição de aulas para professor auxiliar nas classes; revisão do material pedagógico; ensino da matemática – EMAI para o ciclo I do ensino fundamental; recuperação contínua e intensiva; nomeação de 14.473 professores PEB II; convocação de 18.407 novos candidatos para escolha de 14.700 cargos (nomeação em janeiro de 2013); convênio com as instituições de ensino superior para o Projeto Bolsa Alfabetização; ampliação do Programa Sala de Leitura; ampliação do Programa Acessa Escola para as escolas de ensino fundamental; programa Professor Mediador.

Outra iniciativa citada é o aumento da Velocidade do Link de Banda Larga. Atualmente, a maior parte das escolas prioritárias possuem internet com velocidade abaixo de 1 Mbps.

 

Secretaria não envia dados em formato aberto, dificultando acesso à informação

Está na nova Lei de Acesso à Informação (Lei nº 12.527/2011): os dados disponibilizados pela administração pública devem ser preferencialmente fornecidos em formato aberto e acessível.

No entanto, embora o Observatório tenha explicitamente solicitado que as planilhas fossem enviadas em formato eletrônico legível por máquina (CSV, ODS ou XLS), a Secretaria enviou tabelas em PDF, algumas com mais de 150 páginas.

O procedimento, além de inviabilizar o cruzamento e processamento das informações, não faz sentido do ponto de vista da gestão dos dados. Isso porque, antes de um arquivo PDF ser produzido, os dados necessariamente estavam organizados em algum formato tabular.

Para enviá-los em PDF, o servidor responsável pelos arquivos precisou necessariamente convertê-los – o que não se sabe é a motivação para esse procedimento (desconhecimento dos padrões de dados abertos ou intenção de dificultar o controle social de suas ações).

Além disso, quando a equipe do Observatório converteu manualmente cada uma das tabelas, pôde constatar a inconsistência das informações enviadas pela Secretaria.

É o caso dos dados referentes às escolas prioritárias. Em comunicado oficial, a Secretaria disse possuir 1.206 escolas nessa categoria. Na tabela de escolas prioritárias, havia 1.209 – mas 73 escolas estavam duplicadas. Além disso, na tabela em que listava a infraestrutura desses estabelecimentos, apenas 1.062 estavam listadas.

“Mais prioritárias” e emergentes

Segundo a SEE, a maior “ênfase” está sendo dada a escolas selecionadas como “mais prioritárias” dentre as prioritárias. São, de acordo com a Pasta, “escolas que apresentam reincidência” – ou seja, que não conseguem melhorar seus resultados e sair da lista de prioritárias.

De acordo com cálculo do Observatório, 663 escolas (55%) das prioritárias estão nessa condição desde 2009. As 35 Diretorias de Ensino acompanham essas escolas e dialogam com a Secretaria.

Ao ser questionada sobre o momento em que finalizaria a fase de diagnóstico e passaria a implantar as medidas específicas para as escolas prioritárias, a Secretaria, contraditoriamente, negou que ainda esteja em fase de diagnóstico.

“De fato, a execução das políticas anunciadas já estão em andamento. Há também todo um trabalho de conscientização e debate sobre a governabilidade de cada Diretoria de Ensino e assunção de suas responsabilidades”, afirmou.

Estigma

Segundo pedagogos ouvidos pelo Observatório, a caracterização de uma escola como “prioritária” (ou vulnerável, como eram chamadas as escolas no início do programa) pode estigmatizá-la.

“Cria uma marca negativa pra escola, e isso é ruim, mesmo em nome de querer ajudar”, acredita o professor Ocimar Alavarse. Ele diz ser favorável ao uso de avaliações externas – como o Saresp -, mas “não dessa maneira”.

“Os resultados do Saresp são tomados como único indicador de qualidade nas escolas, sem partir dos resultados e proceder a uma série de investigações para poder encontrar explicações para o baixo desempenho”, explica.

“Estabelecidas essas condições para todas as escolas [condições materiais e equipe profissional completa], cada escola tem que ser estudada nas suas singularidades. Aí sim vem toda essa discussão da participação, dos projetos pedagógicos das escolas”.

O Observatório ouviu funcionários de escolas consideradas prioritárias. De acordo com o coordenador pedagógico de uma delas, que deixou de ser prioritária este ano (é considerada agora “emergente”), a escola desenvolveu “ações de acompanhamento”.

Para ele, estar no grupo das prioritárias foi positivo: “eu acho que não prejudicou. Apesar de estar no grupo das prioritárias ter o rótulo de escola ruim, eu acho que ajudou né? Por que foram desenvolvidas ações de acompanhamento com os professores, principalmente intensificando a recuperação contínua, que ajudou a escola a caminhar melhor assim”, diz.

O professor citou como exemplo convocatórias dos coordenadores na Diretoria de Ensino onde eram feitas propostas e encaminhamentos de trabalho a serem desenvolvidas com os professores. Em sua opinião, os professores gostavam da experiência. A SEE também faz avaliação de diagnóstico no decorrer do ano, contou, para “selecionar um pouco mais a recuperação”.

As escolas que saíram da categoria “prioritária” e passaram a ser “emergente” continuam a ter acompanhamento até que consolidem sua melhora.

Quanto aos critérios de classificação dessas escolas, o professor tem apenas uma crítica: não se leva em consideração o fluxo (aprovação, reprovação e evasão). “Às vezes um aluno tem nota boa no Saresp, mas vai muito mal na escola”, opina.


Baixe o levantamento completo em PDF
ou clique aqui para voltar ao índice de reportagens do Especial Educação: Compromisso de São Paulo.

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